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Governo Federal pretende mexer em estabilidade e dificultar progressão de servidores públicos

Desde o final de 2019, está sendo construído um projeto de reforma administrativa pelo governo federal. Depois da Reforma da Previdência, Jair Bolsonaro (sem partido) e Paulo Guedes, ministro da Economia, começaram a preparar um novo ataque aos trabalhadores. Dessa vez, pretendem mexer profundamente na estrutura das carreiras federais e rever a estabilidade dos servidores públicos. A movimentação do Planalto é motivo de alerta também nos estados, já que pode abrir caminho para que as mesmas propostas sejam colocadas em debate em nível estadual.


Na semana passada, o vice-presidente, Hamilton Mourão, afirmou que a reforma administrativa está pronta desde o começo do ano e que cabe a Bolsonaro tomar a "decisão política" de enviá-la ao Congresso. No entanto, o chefe do Executivo decidiu adiar o envio do projeto para 2021, temendo que a proposta possa encontrar resistência em ano de eleições municipais, que tendem a influenciar o humor no Legislativo. A decisão também teria sido motivada pelas eleições para as presidências da Câmara dos Deputados e do Senado, onde o governo pretende emplacar parlamentares aliados.


Mas o Planalto não é o único interessado na reforma administrativa. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), vem insistindo publicamente para que o governo envie a proposta. Em coletiva ele afirmou que vai tentar convencer Bolsonaro a enviar a reforma administrativa do governo e disse também estar disposto a “dividir o desgaste” do tema com o Executivo. A pressão interna também é grande. Com a decisão do governo de deixar a reforma para depois das eleições municipais, o empresário bilionário dono da Localiza, Salim Mattar, deixou o cargo de secretário de Desestatizações; no mesmo dia, o secretário de Gestão e Governo Digital, Paulo Uebel, também pediu demissão.


O fato é que existem muitos setores interessados na desestruturação massiva do serviço público no país, representada pela reforma administrativa. Além disso, esses setores estão contando que irão passar com facilidade, já que as principais mudanças devem atingir apenas os novos ingressantes no funcionalismo público federal. Rodrigo Maia chegou a declarar que acredita que não haverá conflito com os atuais servidores, já que a proposta do governo não versa sobre o passado. No entanto, o desmonte das carreiras públicas tem um impacto generalizado nos órgãos e instituições públicas, como a sobrecarga de trabalho, que impacta diretamente na qualidade dos serviços oferecidos à população.


Mesmo sendo aplicado apenas aos novos servidores, o impacto será profundo e rápido. Um levantamento do Instituto Millenium prevê que um terço dos funcionários efetivos do setor público federal deve se aposentar até 2034. De acordo com o instituto, que se soma na defesa da reforma administrativa, o grupo de servidores prestes a se aposentar teria 219 mil pessoas acima de 51 anos, o que representa 36% dos servidores que estão atualmente na ativa.


A proposta ainda não foi detalhada, mas alguns pontos já foram adiantados pelo governo nos últimos meses, como a redução dos vencimentos iniciais; a redução no número de carreiras, a intenção seria reduzir de 300 carreiras para algo em torno de “20 a 30", como foi afirmado por Guedes em mais de uma oportunidade; e o aumento no prazo para o servidor atingir o topo da carreira, a equipe econômica quer acabar com progressões automáticas, como por tempo, no funcionalismo. Guedes e Bolsonaro também pretendem mexer na estabilidade dos servidores, aumentando o tempo de estágio probatório para de cinco a oito anos, de acordo com a carreira.


O presidente da Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa do estado, deputado Jeferson Fernandes (PT), vê com preocupação a alteração na estabilidade dos servidores: “A República tem como marca o governante se pautar pelo que está no texto legal e, não havendo regra que garanta a estabilidade do servidor, por óbvio que ele vai ficar a mercê o livre arbítrio de quem está no poder”. Ele também esclarece que não se trata de um privilégio, mas de uma garantia para os trabalhadores do setor público: “A estabilidade é um instituto que dá garantia de não perseguição do servidor por conta da posição político-ideológica de quem está no poder. O que não exclui, inclusive, eventuais punições ou a perda da função se, porventura, aquele servidor não cumprir com suas obrigações. Mas ele não poderá ser alvo de perseguição ou de qualquer tipo de sacanagem porque existem regramentos para isso”.


O auditor público externo do Tribunal de Contas do Estado (TCE) e presidente do CEAPE-Sindicato, Josué Martins, acredita que uma reforma administrativa como está sendo discutida pode levar à precarização dos serviços: “O ponto central sempre deve ser a qualidade do serviço público oferecido pelo Estado. Para isso é preciso valorizar os agentes do estado que prestam o serviço e melhorar as condições materiais para tal (em termos de estrutura). Qualquer reforma que não tenha isso em mente só aumentará a precarização. Diminuir o número de carreiras talvez facilite a gerência financeira, mas não trará, necessariamente melhorias ao cidadão. Pelas reformas trabalhista e previdenciária patrocinadas pelo usurpador Temer e continuadas por Bolsonaro/Guedes, a tendência é precarizar também o serviço público”, afirma.


Para o auditor do TCE, medidas como as apresentadas pelo governo federal "não resolverão o problema financeiro federal e dos entes subnacionais. O problema não são os servidores. Os servidores, na verdade, são parte da solução. Não há serviço público sem servidores. A pandemia decorrente da covid-19 demonstrou que não haverá saída exclusivamente de mercado para a crise”. Martins avalia que, se a intenção é equilibrar as contas públicas, “resolver o problema do endividamento público é a tarefa central a ser enfrentada”. Para isso, ele explica que é necessário auditar as dívidas da União e do estado “para verificar o que ainda é devido, se é devido e para quem”. De acordo com os cálculos do Núcleo Gaúcho da Auditoria Cidadã da Dívida Pública, a dívida do Rio grande do Sul com a União já estaria paga desde maio de 2013. “Nos estados a dívida ter servido como instrumento de dominação pela dependência financeira que causa, permitindo que a União edite programas de recuperação econômica que são uma forma de direcionar o essencial da política econômica dos estados”, critica Martins.


No estado, o governo Eduardo Leite (PSDB) já promoveu uma série de contrarreformas no início do ano, mexendo em gratificações e abonos e alterando regras previdenciárias, entre outras medidas. O deputado Jeferson Fernandes alerta para os possíveis reflexos para o estado de uma reforma administrativa federal: “Deixamos o nosso total repúdio a essa pauta em nível nacional. Tem tanta coisa para priorizarem e estão trabalhando nisso com o objetivo apenas de contemplar o capital privado. É óbvio que tem problemas, que o serviço público tem limitações, mas não é em razão das regras que temos hoje. Então, se isso mudar em Brasília, obviamente, no Rio Grande do Sul também vai mudar. Por isso, como presidente da Comissão de Segurança e Serviços Públicos, estamos vigilantes para resistir e continuar lutando para que o nosso povo tenha serviços públicos de qualidade”.


O avanço do tema em nível federal exige mobilização e vigilância dos servidores públicos em todos os níveis. Por isso, o tema será abordado também na live de encerramento da campanha do SINDPERS “Sindicato Forte, Categoria Forte!”. Com o tema “Reforma Administrativa de FHC a Bolsonaro: ataques ao serviço público e o papel dos sindicatos”, a transmissão acontece nesta quarta-feira (19), às 18h30, e pode ser acompanhada pelo Youtube e Facebook do sindicato. Para discutir o tema, convidamos Mariane Ceconello, analista processual da DPE/RS, ex-diretora do SINDPERS e do Sindicato dos Servidores Municipais de Caxias do Sul; Alberto Ledur, agente administrativo do MPRS, diretor e ex-presidente do SIMPE/RS; e Érica Meireles, oficial de defensoria da DPE/SP, integrante da executiva nacional da ABJD (Associação Brasileira de Juristas para a Democracia) e ex-coordenadora-geral da ASDPESP (Associação das Servidoras e Servidores da DPE/SP). A mediação será do coordenador-geral do SINDPERS, Thomas Vieira.


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